Nada de Fórmula 1, Fórmula Indy, A1GP ou GT3. Todos que estiveram na noite de quarta-feira na loja Harley-Davidson do Itaim (SP) queriam saber apenas das aventuras de Emerson no universo das motocas; um capítulo do seu livro de vida que pouca gente conhece.
“Um acidente de moto que meu pai sofreu em Interlagos criou um trauma na família. Tanto é que a minha mãe falou: ‘Até 50cc você pode correr, não pode passar disso’. Foi então que aos 14 anos eu comecei a pilotar uma motocicleta de 50 cilindradas”, contou o bicampeão de F-1.
“Para minha primeira corrida em Interlagos, o Adu Celso (primeiro brasileiro a vencer uma corrida no Mundial de Motovelocidade) me emprestou a motocicleta dele, que era uma 4 tempos. Eu ganhei prova e fiquei super entusiasmado”.
“O Adu morava pertinho daqui, na Cidade Jardim, e no fundo da casa dele tinha uma oficina. Eu ia para lá com a minha motinha, a preparava na sexta-feira e corria em Interlagos no fim de semana”, prosseguiu empolgado o veterano.
“Minha história com motocicletas durou quase três anos. Na última corrida que fiz, competi com uma moto construída pelo Silvano Pozzi, a Moto 5, a primeira motocicleta de corrida feita no Brasil. Era uma máquina muito rápida e bem feita. A fábrica dele era perto da Alameda Barão de Limeira, no centro de São Paulo. E como fabricava kart, pegou um motor de 125cc, adaptou os virabrequins, mudou o pistão e o fez girar 175cc”.
“Eu lembro que eu era pequenininho, menor do que sou hoje, e tinha que ficar na ponta dos pés quando subia na moto. Por isso, precisava que o mecânico me empurrasse para conseguir ligar a motocicleta de corrida”.
“Fiz as 100 Milhas de Interlagos com a Moto 5, em 1963. Eu estava andando bem, mas não pude largar na frente do grid porque a minha mãe desconfiou que eu fosse correr e foi lá no circuito. Naquela época, o público ficava bem perto da largada, então eu saí detrás dos boxes”, revelou Emerson.
“Ela tomou a minha Mondial e eu fiquei sem moto. Uns dois anos depois, quando já estava correndo de automóvel e ganhava o meu próprio dinheiro, comprei uma Ducati 125cc, mas só para o lazer”.
“Sou apaixonado por motociclismo até hoje. Acompanho todas as provas da MotoGP e acho incrível o que os pilotos fazem atualmente na categoria. Na minha época não se andava como agora”.
“Até o ano passado eu tinha uma Harley-Davidson Heritage Nostálgica, de cor prata e branca, lá nos EUA. Aqui no Brasil eu tenho quadriciclos. Dois Bombardier de competição e dois Honda”.
“Tenho um amor muito grande pelo motociclismo e ótimas lembranças. Uma delas está ligada ao John Surtees, o único sujeito a ser campeão de F-1 e Motovelocidade. Você sabe aonde o assisti correr quando eu era moleque? No Ibirapuera, na inauguração do parque em agosto de 1954. O John ganhou a corrida de moto, com uma Norton Manx de 500cc”.
“Lembro também que fui o primeiro piloto a correr de moto com etanol no Brasil. Eu era mecânico de kart e na época preparava os karts do meu irmão e do José Carlos Pace, movidos a álcool antigamente. Daí eu resolvi colocar na moto e melhorou o desempenho”, contou Fittipaldi.
Além das curiosidades de Surtees, Emerson resgatou outros dois nomes famosos no cenário do motociclismo, ambos com passagens nos monopostos. “Eu era muito amigo do Giacomo Agostini. E ele correu de Fórmula 2 e também na Fórmula 1 B. Como tinha muito carro de F-1 naquela época, os dirigentes montaram um campeonato B e o Giacomo entrou. E como andava bem”. "Uma noite de boas histórias do campeão".
“Outro amigo que guiava muito era o Mike Hailwood. Ele andava muito rápido em automóvel. Em motocicleta, então, era excepcional”, ressaltou. De fato, o britânico conduzia uma motocicleta com extrema maestria. Não por menos era chamado de “Mike The Bike”. “Um grande piloto!”, completou Fittipaldi.
Dos astros atuais do motociclismo, o brasileiro não titubeou ao destacar Valentino Rossi, que em 2006 fez alguns testes com a Ferrari na Fórmula 1. “O pessoal da Ferrari fala que o Rossi andou muito rápido. O cara que anda bem de moto tem muita noção para correr de carro”.
Sobre o universo das quatro rodas, Emerson falou pouco. Sem dúvida, teria tantas outras histórias curiosas para dividir, mas naquele dia o bicampeão de F-1 e campeão da F-Indy estava animado e empolgado com as recordações motociclísticas.
Entretanto, a paixão pelos carros deixou escapar algumas informações atuais. Uma delas, por exemplo, relacionada à A1GP, competição chamada de Copa do Mundo de Automobilismo, disputada entre o fim do ano e o início do próximo.
“Estou trazendo uma etapa desta categoria para o Brasil”, revelou Emerson, deixando escapulir também que se de fato a competição vir para o país, correrá em Interlagos. “Nosso piloto será um garoto muito veloz de Brasília, o Felipe Guimarães”, acrescentou.
Por fim, uma informação sobre a GT3, o lazer atual do campeão. “Estou me divertindo muito nesta categoria. Na próxima etapa, no Rio de Janeiro, a emoção deve ser maior porque o (Nelson) Piquet também vai correr”, declarou.
Dois títulos mundiais na categoria máxima do automobilismo (1972 e 1974), dois vice-campeonatos, 14 vitórias, seis pole-positions, 35 pódios, 281 pontos, 11 temporadas e a aventura de competir por uma equipe própria. Uma história de sucesso e de abertura de portas para o Brasil no cenário internacional do esporte a motor sobre quatro rodas que se concretizou com a ajuda da mãe Juze. E sua vassoura.
O motociclismo pode ter perdido um grande nome graças àquelas vassouradas. Mas o que seria do automobilismo sem o grande Emerson Fittipaldi?
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