segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Pista dos bons e velhos tempos

Spa-Francorchamps, um dos mais belos circuitos do mundo, famoso entre outros motivos por suas audaciosas curvas, pelos longos trechos de alta velocidade e por ser a pista predileta da maioria dos pilotos — especialmente os grandiosos corredores —, volta a respirar o acalorado ar da Fórmula 1 após a cansativa corrida de Valência.

Das 52 edições da etapa belga, 40 foram realizadas no tradicional autódromo da região montanhosa das Ardenas, onde foram deixadas inúmeras lembranças marcantes para a história da competição e que contribuíram muito para fazer desta prova um evento sempre aguardado com enorme ansiedade.

O traçado de Spa impressiona em cada centímetro dos seus mais de sete quilômetros de extensão. Nele, encontram-se épicos setores como a curva em subida da L’Eau Rouge, o trecho em descida da Les Combes e Malmédy, o cotovelo da Rivage, a velocíssima Blanchimont, a clássica chicane da Bus Stop e o grampo da La Source.

Outro ingrediente responsável por dar um sabor especial a esta prova está nas condições climáticas, que sempre aprontam das suas. Seja nos treinos ou na corrida, a chuva dificilmente deixa de marcar presença, tornando a vida dos pilotos ainda mais complicada. Quem não se lembra do GP da Bélgica de 1998, que teve a largada marcada por um baita engavetamento, graças à presença de uma tempestade?

Não bastasse o incidente ocasionado no início da disputa, que obrigou a realização de uma nova largada, aquele dilúvio também seria o responsável pelo abandono de 16 dos 22 carros do grid, incluindo Michael Schumacher, que se encaminhava tranqüilo rumo à vitória até encontrar um retardatário chamado David Coulthard.

Sem enxergar direito em função do spray de água, o alemão acertou a traseira do McLaren do escocês, tendo de se recolher aos boxes com apenas três rodas. Ao descer do cockpit, partiu irritado em direção à garagem do adversário para tirar satisfações e só não saiu no tapa com o rival porque os mecânicos estavam lá para conter os ânimos.

Mas as surpresas da corrida ainda não tinham se esgotado, já que Damon Hill e Ralf Schumacher garantiram a dobradinha para a extinta equipe Jordan. Fora a primeira consagração do time irlandês na categoria. Jean Alesi, à época na Sauber, terminou em terceiro.

Dois anos mais tarde, em 2000, Michael Schumacher voltou a ser assombrado por um carro da McLaren, desta vez pelo de Mika Hakkinen. A quatro voltas do final, o finlandês assumiu a liderança com uma magnífica ultrapassagem sobre o tedesco, a qual teve a BAR de Ricardo Zonta como coadjuvante.

A obra de arte aconteceu a poucos metros da freada da Les Combes. Schumacher fechou a porta pelo lado de fora, Zonta ficou no meio do traçado e Mika arriscou tudo indo por dentro, deixando os dois carros para trás. Uma manobra ousada que deu certo e foi maravilhosa.

Episódios de 98 e 2000 à parte, Schumacher teve um relacionamento muito especial com Spa-Francorchamps. Foi neste circuito que o heptacampeão fez a sua estréia no certame, em 1991 pela Jordan, sendo escalado às pressas como substituto do belga Bertrand Gachot, que dias antes do GP havia sido preso por espirrar spray de pimenta nos olhos de um taxista, após uma discussão no trânsito.

Em 1992, justamente na Bélgica, o alemão venceu a sua primeira corrida na Fórmula 1, correndo pela Benetton. Ao longo da carreira, conquistou outras cinco vitórias na pista de Spa, onde coroou ainda o seu sétimo e último título mundial, ao terminar em segundo na etapa de 2004.

Por todos esses motivos, o ex-piloto jamais escondeu o seu enorme apreço pelo GP da Bélgica. Um carisma que Ayrton Senna também fazia questão de ressaltar. O brasileiro foi o segundo maior vencedor em Spa-Francorchamps com cinco proezas, ficando atrás somente de Schumacher (6). Jim Clark, outro nome grandioso na história da categoria, ocupa o terceiro lugar do ranking, com quatro vitórias.

Além de Senna, o Brasil conseguiu com Emerson Fittipaldi subir por duas vezes no degrau mais alto do pódio na Bélgica. Não em Spa, mas no autódromo de Nivelles, que sediou o evento nas temporadas de 1972 e 1974. De 1975 a 1982 e nos anos de 73 e 84, a corrida foi realizada em Zolder, aonde Gilles Villeneuve veio a morrer tragicamente no treino de classificação da prova de 82.

O canadense estava em sua última volta rápida quando se deparou com o March de Jochen Mass, que retornava lento para os boxes. Sem tempo de mudar a trajetória, o piloto da Ferrari acabou batendo na traseira do adversário e foi lançado para fora do cockpit depois de várias capotagens.

Em Spa, quase duas décadas após a tragédia de Zolder, era o filho de Gilles que sofria uma forte pancada nos treinos, ao perder o controle do monoposto em alta velocidade na L’Eau Rouge. Jacques, felizmente, nada sofreu no acidente com sua BAR em 1999. Assim como Zonta, que escapou com o outro bólido da BAR no mesmo ponto e na mesma sessão.

Alessandro Zanardi, Giancarlo Fisichella e Luciano Burti também guardam lembranças de impressionantes batidas na pista de Spa-Francorchamps. O brasileiro nem tanto, pois afirma até hoje não se recordar de praticamente nada do incidente sofrido em 2001, no qual perdeu o controle do modelo da Prost após um toque na traseira de Eddie Irvine e foi ao encontro da barreira de pneus, sofrendo uma concussão.


Em 2006, em virtude de amplas reformas na área de boxes e paddock, o GP da Bélgica ficou de fora do calendário. Voltou no ano passado e selou a vitória de Kimi Raikkonen, a terceira seguida do finlandês, que ganhou em 2004 e 2005.

Apesar do fraco desempenho no campeonato atual, é de se esperar certo favoritismo do campeão para a corrida do próximo fim de semana, afinal está entre os fãs incondicionais deste Grande Prêmio. Confirmar este prognóstico, na verdade, chega a ser quase uma obrigação para o nórdico, pois está a 13 pontos da liderança do certame e atrás também do companheiro de equipe.

Por falar nele, Felipe Massa parte em busca da quinta vitória na temporada numa pista onde andou muito bem no ano passado, sempre na cola de Raikkonen. Foi o segundo em 2007, quando não era nem a metade do piloto maduro, rápido e constante que demonstra ser na atualidade. Desponta, portanto, como um forte candidato ao topo do pódio.

Resta saber como estará a McLaren para esta etapa. Pelo retrospecto (12 vitórias contra 14 da Ferrari) deve vir com força, ainda mais se lembrarmos que o time inglês dispõe agora de um carro de distância entre-eixos maior que o do ano passado; uma característica importante para as pistas com curvas de alta velocidade como a de Spa. Além disso, existe o fator Lewis Hamilton, líder da competição.

Promessa de briga, não é mesmo? Mas não nos esqueçamos da BMW, que em circuitos velozes costuma entrar no páreo pelas primeiras colocações — olhos atentos em Robert Kubica. Outra equipe a se observar é a Toyota, quarta colocada no Mundial de Construtores e geralmente bem apresentável na Bélgica.

Ultrapassagens? Em Spa são freqüentes e neste momento muito desejáveis de serem vistas para compensar a escassez da etapa de Valência. Nada supera um circuito tradicional!

Ficha técnica - GP da Bélgica

Circuito de Spa-Francorchamps
Extensão: 7.004 m
Voltas: 44 (308.052 km)
Número de curvas: 15 (7 para a esquerda, 8 para a direita)
Velocidade máxima: 330 km/h
Provas realizadas: 40 (em Spa)
Recorde de pole-position: Michael Schumacher em 2002 com a Ferrari (1min43s726)
Melhor volta em corrida: Kimi Raikkonen em 2004 com a McLaren (1min45s108)

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